resumo do folhetim: eu se calhar não sou o tweetyatropelamentos, câmaras municipais, polícias, tudo feito para me tramar e afinal a lesada tinha sido eu e o meu carrinho. eles pensavam que se safavam por serem do poder mas eu tinha tirado a matrícula e aquele pormenor do leão adolescente perto do hospital não foi despiciendo. e além disso ainda há pessoal íntegro nos corredores do poder e outros que pareciam tão leais quando tinham oks de todo o lado, mas sozinhos, sem mais apoios que o da sua consciência, o fundamental suporte pensava eu, sozinhos valem menos que nada pois o nada é honesto e sabe o seu lugar. e eu ali toda partida por dentro mais que por fora a fingir que não era nada comigo enquanto traçava com ânimo acrescido e com o meu improvisado staff a estratégia que derrotaria não só aquela direcção mas toda a deslealdade e gente sem princípios que só me provocavam um segundo olhar do mais profundo desprezo. não estava certa a vitória apesar das provas incontestáveis a meu favor, pois eu sabia que eles tudo iriam fazer para as destruir ou desacreditar. era fundamental passar o mais despercebida possível. com um turbilhão de pensamentos a atingir-me ao mesmo tempo baixei a cabeça quando as velhas passaram na rua para que não me vissem deitada na maca do hospital a esconder-me dos olhares vingativos e conspícuos dos guardas.
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Terça-feira, Maio 01, 2007
eu sabia que qualquer passo que desse em falso podia comprometer o resultado final de toda a estratégia, pelo que depois de sair do hospital restringi ao máximo as saídas à rua. sentia-me duplamente debilitada pelo acidente e pela traição posterior pelo que acertámos que o melhor seria resguardar-me até que estivesse reunida toda a documentação incriminatória evitando-se assim a possibilidade de confrontos desnecessários e perturbadores da minha paz mental e integridade física.
publicado por vague às 2.5.07
donald pegou-me na mão transmitindo-me uma certeza: a de não estar sozinha naquela inesperada aventura. desde o acidente e o posterior desenrolar dos acontecimentos a sua crescente proximidade e rectidão de carácter tinham-no transformado aos meus olhos no mais seguro porto de abrigo.
sorri-lhe reconhecida. quando chegámos à reunião ainda vinhamos de mão dada, a mão dele agarrando a minha, abandonada, na sua pele.
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descemos ao local da reunião, uma sala escura e aquecida onde o fumo desenhava no ar círculos enigmáticos e a rádio tocava uma música impossivelmente bela.
donald largou-me a mão e olhou-me apreensivo. quando cruzei os olhos com os dele regressei à realidade e senti o coração a bater com um compasso dorido e rápido, como se um mecanismo invisível me desse pancadas surdas no peito. de tanto bater o meu coração parou. no meio do improvável, lembrei-me do título do filme.
"boa noite, meus senhores", cumprimentei, sentindo a voz trémula mas decidida.
publicado por vague às 3.5.07
"o que nos traz aqui tem a ver, mais que com o acidente, com a forma como esta câmara está a desvirtuar as suas responsabilidades políticas e cívicas, num grau tal que me leva a pensar se não será isto um princípio - ou já, quem sabe? sintoma - de uma imensa bola de neve que nos arrastará a todos para uma nova ditadura."
a pouco e pouco senti-me desfalecer. não tinha comido nada desde o almoço e a fraqueza e o ar excessivamente aquecido da sala causaram-me um efeito estranho: sentia-me quase a desmaiar e, ao mesmo tempo, o coração batia fortemente, como se estivesse dentro da minha cabeça.
deixei de atribuir significado aos rostos que me cercavam e comecei a ver imagens como num sonho: via um coração gigante a correr e a arfar por ter corrido; depois a deixar-se cair e a imobilizar-se no chão. de seguida vi o homem-aranha a saltar dos céus e a fazer-lhe respiração boca-a-boca. donald disse-me mais tarde que desmaiei e que quando acordei a primeira coisa que lhe disse foi que queria ir ver o novo filme do Homem-aranha. não entendo os mecanismos da mente mas atribuo aqueles momentos de inconsciência ao cansaço dos últimos dias e aos meus nervos abalados. sei que devo ter adormecido, pois quando acordei estava deitava na cama de donald.
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descobri a música que tocava baixinho como sendo a que tinha ouvido na véspera. mais uma coincidência e aquela música impossivelmente bela seria minha - nossa? - para sempre.
e depois pensei. mas que sonhos andava eu a sonhar sem chão para me suster? porque pensava de repente em donald como se ele fizesse parte da minha vida? e porque estava deitada numa cama onde nunca tinha estado e não me sentia estranha?
decidida a pôr de lado pensamentos inoportunos levantei-me e dirigi-me à sala. precisava de saber que balanço tinha sido feito do dia de ontem. depois disso pensaria em donald.
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quando entrei na sala donald estava sentado a uma secretária e tão absorto em documentos que senti necessidade de me fazer anunciar por uma diplomática tosse. vi-lhe o perfil a contornar a luz e a buscar-me os olhos.
entra. dormiste bem? estás com um ar tão sereno.
publicado por vague às 21.5.07
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