Um escrever com luz *
Gosto dela na forma desassombrada límpida e sensível como se revela escritora, como gosto do seu registo de jornalista, vincado pela honestidade intelectual que se sente nas posições e coerências que persegue ou a perseguem, na cidadania empenhada.
Ouvi a Inês Pedrosa há pouco na TSF numa entrevista de arquivo. Falava-se, às tantas, no significado de "escrever bem". Tal como ela, tenho a convicção que não basta 'escrever bem', no sentido de respeitar a gramática, a sintaxe de uma língua, para se ser escritor. O que interessa é encontrar a própria voz (se ela existir) que pode até ludibriar os cânones tradicionais da escrita e do conceito de 'bem escrever'- vejam-se os casos de Mia Couto, de António Lobo Antunes ou de Saramago, que enriquecem e (re) inventam (novas) formas de escrever.
Pode-se 'escrever bem' sem que se tenha alma ou rasgo. Para escrever , independentemente das leituras que façamos da expressão, é preciso ter lido. Muito. E para alguém se dar ao luxo de desconstruir palavras e formas tradicionais de escrever tem de as ter absorvido primeiro - é o que lhe dá autoridade e segurança. Mas isto é técnica. Além dela é preciso alma, é de alma que falo, como a Inês Pedrosa fala de encontrar a voz interior, o fluir único, compulsão criadora que comova e espanta por ser.
E eu vou dormir embora me apetecesse ficar noite dentro a deambular pelas escritas da blogosfera, que me roubam o tempo à leitura espalhada pela casa, com cheiro de papel e toque de mestre. Mais logo é Agosto de trabalho e eu não vivo do que leio nem do que escrevo. Vivo também no que escrevo. Para chegar mais perto.
*Agosto de 2004, copiado do meu outro eu