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La marée haute
segunda-feira, dezembro 13, 2004
  Quantas formas de violência existem? II

No dia 27 de Novembro passado, o PÚBLICO deu à estampa um artigo de opinião intitulado "Notícia da mulher que deixava a comida esturricar ", na co­luna Semana Política, seguido de outro, em 30 de Novembro, sob o título "Estalos e pontapés", na coluna Comentário, ambos versando o desfecho de um processo penal em última instância. O conteúdo dos dois artigos suscita esta resposta e estamos certos de que o PÚBLICO dispensa subli­nhados especiais de natureza legal para a sua publicação.

O processo judicial visado entrou no Supremo Tribunal de Justiça (STJ) como recurso relativo à pena decidida em pri­meira instância face a um dado crime de homicídio em que o recorrente é o arguido: catorze anos de prisão em cúmulo jurídico, confirmados pelo recurso intermédio a um tribunal de Relação e reduzidos para 11 anos no acórdão do STJ.

Diz o primeiro daqueles artigos (já que o segundo se limita a um comentário, mas em idêntico seguimento) que o acórdão do STJ em causa "refere que não terão sido alheias ao crime as condutas anteriores da vitima", tais como "levantamentos bancários deixando as contas do casal a zero", e que constituiu "atenuante do crime de homicídio o facto de a vítima ter deixado algumas vezes esturricar a comida que confeccionava"'. Nas pala­vras do articulista, "para os juizes do Su­premo na democracia de 2004, é atenuante do crime de homicídio ir ao café ou não avisar o marido de uma saída" e a vitima ter chegado "a mostrar a barriga quando se encontrava junto de pessoas amigas", entendendo ainda que "os juizes admitem serem os
comportamentos resultantes dos problemas psíquicos da vítima decorren­tes da morte de uma filha do casal", para acentuar que estes aspectos comportamen­tais foram reduzidos pelo STJ "à simplória categoria de desavenças conjugais", nos termos do mesmo acórdão.

Afirma ainda o articulista que "foram dados como provadas agressões do argui­do à vítima - `insultos, murros, estalos e pontapés que a suprema judicatura considera irrelevantes para o assunto, reduzindo-as à simplória categoria de desavenças conjugais"', e acrescenta que o STJ "considera conduta atenuan­te de um homicídio o deixar esturricar a comida" para concluir que "a violência doméstica é um crime público" e que "o acórdão do Supremo viola, evidentemen­te, o espírito da lei".

Ora, o teor do(s) artigos) em apreço deturpa totalmente a verdade. Sobre os factos descritos aquele acórdão do STJ (n °3250/04-3) - mesmo apenas pela leitura linear das passagens alheias aos aspectos técnicos - permite entender que o STJ não só não os considerou atenuantes, co­mo, bem pelo contrário, deixa claro que o recorrente pretendeu "empolar" algumas atitudes da vítima como circunstâncias atenuantes. Por isso, o colectivo do STJ acentua que recusou atendê-las e que, da sua análise, "não resulta qualquer moti­vação susceptível de justificar atenuação especial da pena".

No fundo e em rigor, o STJ nem sequer atenuou a pena. O que um colectivo de juízes-conselheiros fez, como lhe compe­tia, foi reponderar a aplicação da lei ao quadro real envolvente de um arguido concreto (análise ao comportamento con­jugal e diagnóstico psiquiátrico do casal, comportamento social e familiar, respon­sabilidade paternal, etc.), do que resultou o seguinte: redução de 13 para dez anos de prisão pelo crime de homicídio; acresce um ano de prisão pelo crime de violência doméstica (no caso, "maus tratos a côn­juge"), aplicado em primeira instância e que não foi objecto de recurso. Por outras palavras: o recorrente reclamava sobre a pena de homicídio, sem apelar da decisão pelo crime de violência doméstica.

De qualquer modo e como é habitual, o STJ está sempre disponível para prestar todos os esclarecimentos sobre quaisquer decisões de última instância e respectivos fundamentos, no sentido de facilitar o mais amplo conhecimento sobre matérias que, muitas vezes, têm um conteúdo técnico-le­ga nem sempre preendido com facilidade pela opinião pública.



João de Carvalho
Gabinete de Imprensa do STJ

Público de 7 de Dezembro


 
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